10/12/2015

A Lua Vermelha da Menstruação - da Antiguidade à Celebração do Primeiro Sangue #2



Dois dias atrás comecei a primeira parte sobre A Lua Vermelha da Menstruação, falando sobre a importância de se observar o ciclo lunar e a criar seu próprio "Diário de Sangue".
A primeira e mais antiga forma de medir o tempo foi pelo ciclo menstrual das mulheres. Olhando o céu e contando os dias para a chegada da menstruação ou para a confirmação da gravidez, as mulheres criaram os primeiros calendários e estabeleceram as bases do conhecimento mítico e mágico da Lua. A raiz da palavra "menstruação" vem do latim mens e significa "lua" e "mês", também derivado do nome da deus grega Mens, que ajudou as mulheres a criarem o calendário.
Para os povos antigos, a menstruação era um dom dado às mulheres pelas Deusas para que elas pudessem criar e perpetuar a própria vida. A sincronicidade do ciclo lunar e menstrual refletia o vínculo entre a mulher e a divindade, pois ela guardava o mistério da vida em seu corpo e tinha o poder de tornar real o potencial da criação. Esses ciclos também refletiam as estações e mudanças da natureza, o ventre aparecendo como receptáculo da vida eterna, simbolizado pelo cálice, caldeirão ou Graal em vários mitos. Todos os homens nascem da mulher, seus corpos são formados dos tecidos de seu útero, o sangue que corre nas veias do recém-nascido é o sangue de sua mãe. O poder da mulher vem através de seu sangue, por isso ela não deve temê-lo ou desprezá-lo, mas considerá-lo sagrado, imantado com o poder que liga a mulher à Fonte da Criação.

Considerada pelos povos antigos como a "Flor da Lua" ou o "Néctar da Vida", a menstruação passou a ser denegrida e desprezada pelas sociedades patriarcais, que a consideravam a origem do poder maligno da mulher, a marca do demônio, o castigo dado a Eva por ter transgredido as regras de obediência e submissão. Enquanto que nas sociedades matrifocais as sacerdotisas ofereciam seu sangue menstrual à Deusa e faziam suas profecias durante os estados de extrema sensibilidade psíquica da fase menstrual, a Inquisição atribuída a esse poder oracular a prova da ligação da mulher com o Diabo, punindo e perseguindo as mulheres "videntes". E assim originaram-se os tabus, as proibições, as crendices e as superstições referentes ao sangue menstrual.



 
 (arte de 3M3)

"Tabu" é uma palavra de origem polinésia, cujo significado - "sagrado" - refere-se a tudo aquilo que, por ser imbuído de um poder especial chamado "mana", não podia ser tocado ou usado por pessoas que não estivessem preparadas para lidar com essa energia, o que poderia ser-lhes prejudicial. O sangue menstrual ou pós-partum era impregnado de "mana", sendo por isso considerado sagrado, ou seja, "tabu".
Com o passar do tempo, o significado da palavra "tabu" foi deturpado para "proibido", recebendo uma conotação negativa e até mesmo perigosa, principalmente para os homens que temiam esse sangramento misterioso da mulher. Esse temor vinha do fato de que o homem, quando sangrava, era por ferimento ou doença, com consequencias quase sempre fatais.
Infelizmente, milênios de supremacia e domínio patriarcal despojaram as mulheres de seu poder inato e negaram-lhe até mesmo seu valor como criadoras e nutridoras da própria vida. Reduzidas a meras reprodutoras, fornecedoras de prazer ou de mão-de-obra barata, as mulheres foram consideradas incompetentes, incapazes, desprovidas de qualquer valor e até mesmo de uma alma!

Não mais o respeito e a veneração pelo poder sagrado de seu sangue, mas a vergonha, a repulsa, o silêncio sobre "aqueles dias", as acusações e explicações "científicas" dos estados depressivos, explosivos ou das mudanças de humor como algo mórbido, que deveria ser tratado com remédios ou com a indiferença.
Em vez dos antigos rituais de renovação e purificação nas Cabanas ou Tendas Lunares, onde as mulheres se isolavam para recuperar suas energias e abrir seus canais psíquicos para o intercâmbio com o mundo espiritual, a mulher moderna deveria disfarçar, esforçando-se para continuar com suas atribuições cotidianas, perdendo o contato e sintonia com seu corpo e com a energia da Lua. O resultado é a tensão pré-menstrual, as cólicas, o ciclo desordenado, o desconhecimento dos "Ritos de Passagem" e dos "Mistérios da Mulher". As meninas passam por sua menarca sem nenhuma preparação ou celebração, aprendendo, muitas vezes, as verdades sobre seus corpos de forma dolorosa ou prejudicial. Ao chegar na menopausa, a mulher sente-se marginalizada, desprezada, envelhecida, sem receber o apoio ou o ensinamento de como atravessar e aproveitar essa nova fase plena de possibilidades e de sabedoria.
Pelo ressurgimento do Sagrado Feminino, as mulheres estão aprendendo o verdadeiro valor sagrado de seus corpos, de suas mentes e fases de transição na vida da mulher: a menarca (a primeira menstruação), a maturidade sexual, a gestação,  o parto e a menopausa.
É imperativo à mulher contemporânea recuperar a sacralidade de sua biologia. Para isso, ela deve lembrar seus antigos conhecimentos, compreender os verdadeiros mitos e arquétipos de sua natureza lunar, reconhecer o poder mágico de seu ventre e sua conexão com a Deusa.
A sociedade atual, altamente industrializada e intelectualizada, é carente de Ritos de Passagem e Celebrações, preocupando-se apenas com a produtividade, o consumismo e os modismos.
É vital para a mulher moderna suprir essa lacuna lendo e reaprendendo as antigas tradições, usando a sua intuição e sabedoria para adaptá-las à sua realidade moderna, celebrando os Ritos de Passagem.
Esse ato de "acordar" e "relembrar" reconecta a mulher à sua essência verdadeira, dando-lhe novos meios para viver de forma mais plena, harmônica, mágica e feliz.


Celebração do Primeiro Sangue 

A partir do momento que a mulher reconhece o poder sagrado de seu sangue, é importante a ela reviver sua primeira menstruação, principalmente se foi uma experiência dolorosa ou traumática.
A primeira menstruação chama-se menarca, proveniente do grego "men" - significando a lua e mês - e "arkhe" - significando início e começo. É um momento extremamente importante na vida da mulher, não apenas por ser o primeiro contato com seu sangue, mas também por ser o começo de um longo processo mensal, que marcará sua vida por cerca de trinta e cinco anos. Nas antigas culturas e tradições, nesses momentos a mãe apoiava a filha de forma amorosa e sábia, ensinando-lhe os "segredos" de seu poder e dando-lhe a certeza de seu potencial e de sua missão como mulher. Como uma borboleta saindo de seu casulo, a menina, ao sair da infância, emergia em um mundo novo, cheio de possibilidades e imprevistos, necessitando, por isso, conhecer e confiar em seu próprio poder.
Infelizmente, nas culturas patriarcais que prevalecem até hoje, inúmeras mulheres passaram por experiências extremamente negativas durante sua menarca, não dispondo de informações ou recursos internos para, por sua vez, guiar e iniciar suas filhas na condição de mulher.
Originariamente, a menarca era a entrada da menina para o misterioso e poderoso reino do "mana", o poder sagrado, sendo um acontecimento repleto de significados e alegria.
Atualmente, ao contrário, a passagem da maior parte das mulheres pela menarca foi acompanhada pelo medo, vergonha e insegurança. Da noite para o dia a menina se vê mulher, sem ter uma cerimônia ou ritual para celebrar e consagrar essa passagem.

Lembrar e reviver a menarca a partir de uma perspectiva adulta, possibilita à mulher ter uma nova visão de si mesma, dando-lhe os recursos interiores para poder apoiar e conduzir sua filha por essa passagem, de forma segura e sábia. Essa exploração pode ser transformada em um verdadeiro rito tardio de passagem, permitindo a cura das feridas, conscientes ou não, relacionadas a esse momento tão importante e pouco compreendido.
É necessário reconhecer a primeira menstruação como um momento marcante na experiência da condição feminina, pois as emoções permanecem impressas para sempre na psique, determinando os conceitos sobre os ciclos menstruais, a sexualidade e a própria postura como mulher.
Não importa se você menstrua há anos ou se já parou de verter seu sangue, tornando-se uma "mulher sábia". A cerimônia recomendada vai curar as feridas da psique e transformar sua própria essência de mulher. Mudando o conceito sobre menstruação, revivendo a menarca e criando seu próprio Rito de Passagem, a mulher moderna reclama seu poder, iniciando uma transformação mental e emocional e se reconectando a seu poder sagrado original.

Como o artigo ficou grande, e é muita informação de uma vez só, resolvi dividir esse post em três. Clique aqui e leia a terceira e última parte - A Lua Vermelha da Menstruação - Cerimônia do Sangue, O Altar e a Última Menstruação ❤.

 *Fonte: O Anuário da Grande Mãe, de Mirella Faur.

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